OS TRÊS PILARES DO PALÁCIO DO AMOR

"Todos os bailarinos submergiram na colina." T.S.Eliot
“Todos os bailarinos submergiram na colina.” T.S.Eliot

“Temer o amor é temer a vida e os que temem a vida já estão meio mortos.” Bertrand Russell

Já não posso dizer que não sei nada sobre o amor, pois eu conheci sua dor e sua delicia até o limite da experiência. Seja como for, tentarei condensar no texto abaixo as considerações psicanalíticas do médico Flávio Gikovate sobre esse sentimento sublime e, não raro, sofrido. Para ele um amor adulto e sustentável deve se alicerçar em três pilares primordiais: afeto, sexo e razão. Vamos tentar mapear o DNA de um amor maduro. Quem sabe a partir dessas informações não aprendemos a amar com sabedoria? O genuíno amor sempre trará três coisas consigo: enriquecimento, espanto e encanto.

PRIMEIRO PILAR DO AMOR: AFETO. Segundo o médico (e por extensão a própria psicanálise) o afeto é fundamental numa relação (às vezes inexplicável ou nem tanto, pode nascer da admiração, da essência, da atração, da sedução, etc. Para mim é fácil amar uma pessoa inteligente, ética e gentil.), representado pelo desejo de se unir aquele ser em particular, de lhe querer bem acima de tudo, de cuidar dele, de fazê-lo feliz e também a impossibilidade de imaginá-lo com outro indivíduo. O amor é uma união de corpos, corações e cérebros ou não é amor. O amor não é para amadores. O amor é um sentimento selvagem e delicado ao mesmo tempo. Numa palavra: inefável.

SEGUNDO PILAR DO AMOR: SEXO. Bem, se você pretende velejar pela vítrea vida vinculado a doce companhia de alguém especial é essencial possuí-la e entregar-se a ela de corpo e alma. A pessoa precisa ser suculenta e incendiária, carinhosa e criativa, querer dá e receber prazer. (O amor negocia sem egoísmo.). Afinal, o sexo só é satisfatório e inesquecível quando feito com amor. Segundo Erich Fromm: “O sexo só pode ser um instrumento de fusão genuína – em vez de uma efêmera, dúbia e, em última instância, autodestrutiva impressão de fusão – graças a sua conjunção com o amor. Qualquer que seja capacidade de fusão que o sexo possa ter, ela vem de sua camaradagem com o amor.” Nesse pilar está incluso além da intimidade física a virtude da fidelidade. Internalizar a síndrome do escaravelho negro: ser leal ao seu amor até o fim. A reinvenção é crucial para o crime, eu quis dizer, para o amor, além do perdão. Talvez o grande segredo do amor seja a paciência que perdemos em amores falsos.

TERCEIRO PILAR DO AMOR: RAZÃO. Segundo o velhinho (como carinhosamente chamo o Flávio) a razão significa sensivelmente duas coisas: afinidades intelectuais e morais e condições materiais. É indubitavelmente indispensável partilhar afinidades intelectuais e morais com seu par romântico, e ter caráter e personalidade parecidos. Em suma, serem dignos, cultos, divertidos, justos, sinceros, amorosos, nobres, bondosos e generosos além de apreciarem o mesmo arco de lazeres como leitura e escrita, socializações e viagens, possuírem consciência social, política e ecológica, gostos e objetivos semelhantes, química, filosofia e psicologia, bom humor e fazerem um ao outro rir, numa idéia: ter telepatia conjugal. Saber o desejo do outro pelo olhar.

Acima: um livro excepcional. Amei a parte que o autor diz que substituímos “a introspecção por uma interação frenética e frívola” e o amor verdadeiro (aquele com potencial para ser perpétuo, companheiro e doce) por amores líquidos (que se trocam de tempos em tempos, mas que não satisfazem e só geram mais vazio e angústia em nós.)
Acima: um livro excepcional. Amei a parte em que o autor diz que substituímos “a introspecção por uma interação frenética e frívola” e o amor verdadeiro (aquele com potencial para ser perpétuo, companheiro e doce) por amores líquidos (que se trocam de tempos em tempos, mas que não satisfazem e só geram mais vazio e angústia em nós.)

Quanto às condições materiais refere-se obviamente a esfera econômica dos parceiros, mas ela não deve ser um obstáculo intransponível a felicidade dos amantes. O amor é mais importante do que a diferença de classes. Soma-se a esse pilar da razão um projeto de vida em comum como casar e constituir família e envelhecer de mãos dadas. (O amor avalia o todo e pensa a longo prazo.) É doce ficar com quem amamos, abraçar, beijar, fazer amor, dormir de conchinha e tomar café da manhã. Ter com quem ir ao cinema ou ficar em casa num domingo chuvoso conversando ou lendo ao lado um do outro. Você só tem uma vida finita para ser feliz e se puder encontrar o grande amor da sua vida nela não perca a oportunidade de vivê-lo porque o mundo é contra. Siga seu coração e ame.

Outra idéia seminal do Flávio chama-se +AMOR “A união de dois inteiros e não de duas metades”. Segundo ele os amores que aspiram à imortalidade devem constituir uma fusão entre amor e amizade. O melhor do amor e o melhor da amizade interpenetrados dando luz a uma relação madura de companheirismo, de respeito à individualidade do outro e de confiança mútua com o mínimo de sofrimento e o máximo de solidariedade possível. Em suma, após acontecer entre duas criaturas meigas e mágicas o que o Cazuza chamou de “coincidência”, ou seja, “amor recíproco”, para conseguirmos o que outro velhinho brilhante, o sociólogo polonês Zygmunt Bauman chamou de “encontrar a intimidade, a alegria, a ternura e a afeição.” é imprescindível cultivarmos uma relação de amizade autêntica com nosso parceiro afetivo operada através do diálogo democrático e fruindo assim os deleites divinos desse amor-amigo. Talvez a grandeza do amor esteja em nos possibilitar autoconhecimento pela alteridade.

O amor talvez seja a única cura para nossa ferida existencial. Amar é preciso, pois o amor nos salva de nosso voraz vazio interior e nos liberta de nosso egoísmo estrutural. Mas o amor também pode ser sinônimo de angústia, medo e incerteza além de raiva, dor e decepção (é preciso ser realista se desejamos redenção). O amor é cheio de defeitos. Contudo, suas qualidades superam seus erros e assim como a democracia ele é a única cura para o seu próprio mal. Segundo o filósofo francês Luc Ferry “Só o amor dá sentido as nossas vidas.”. Sem amor somos com zumbis vagando a esmo. Amor é vida, energia e magia. Amor é mistério, paixão e poesia. Amor é estrela, sonho e perspectiva.

Não escolhemos quem amamos, mas escolhemos como amamos e só há uma maneira de amar: com amor infinito, incondicional e imortal. A felicidade que duas pessoas que se amam profunda e verdadeiramente pode proporcionar uma ao outra é ilimitada. Sob os três pilares supracitados é possível construir um palácio do amor e ter uma vida virtuosa, vitoriosa e voluptuosa ao lado daquele a quem pertence nosso faminto coração. Respiramos por amor e uma vida só vale a pena se for vivida dentro do abraço do amor.

O amor é capaz de fazer o impossível. O coração acelera como um jatinho e miamos como gatinhos. O amor é salvador como Jesus, doce como o vinho, louco como a porra e às vezes tragicômico como a vida. O amor é definitivamente o grande sentido da vida.

Meu coração outrora mergulhado no abismo da solidão encontrou a luz do amor e sorri.

“É tão absurdo dizer que um homem não pode amar a mesma mulher toda a vida, quanto dizer que um violinista precisa de diversos violinos para tocar a mesma música.” Honoré de Balzac

“Nietzsche disse que só existe uma pergunta a ser feita quando se pretende casar: continuarei a ter prazer em conversar com esta pessoa daqui a 30 anos?”


Thiago Castilho

Advogado e escritor, um homem de leis e letras. Acredito que a arte pode “ensinar a viver”. Ensinar a viver significa ensinar a lutar pelos seus direitos e a amar melhor a si e a toda humanidade. Adquirir o conhecimento e transformá-lo em sabedoria de vida no palimpsesto do pensamento. Eis meu ideal intelectual que busca realizar a experiência do autoconhecimento, não sei até se do absoluto e talvez do Sublime aplacando assim minha angústia existencial, sem soteriologia, porque ao contrário de Heidegger não acho que somos seres-para-a-morte, mas seres-para-a-vida e seres-para-o-amor.

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